quinta-feira, 18 de abril de 2019

Capitulo Teste: "Gato Preto ou Mula-Sem-Cabeça?"

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Fazenda “Orelha de Cachorro” (BL) – 21:43

Golpeei com tanta força que, semelhante a Moisés ao abrir caminho entre as águas do Mar Vermelho, meu machado dividiu a face do monstro ao meio; dois pólos distintos cortados por uma larga linha em diagonal. A criatura caiu na terra úmida, ainda com algumas reações nervosas pendentes, mas acredito que não vá mais se levantar...

Avistei outros 7 nos limites do terreno, forçando a cerca e arrastando o arame farpado aos trôpegos tortos de seus corpos mortificados. Corri para dentro e apanhei minha Avtomat Kalashnikova 1947. Ao voltar, deparei-me com os amaldiçoados subindo o morro, vindo com fadiga de fome em direção a casa. Mirei a frente e abri fogo contra tudo o que se mexia. O potente calibre da arma dilacerou seus corpos; projeteis lançados ao acaso pela minha irracionalidade deceparam braços, pernas, cabeças, fertilizando o solo com suas entranhas. Foi necessária apenas uma recarga para acabar com toda a trupe de demônios.

Pode parecer cruel, se levarmos em conta que essencialmente eles são humanos; mas nosso parentesco termina neste ponto, pois estamos falando de bestas canibais esfomeadas, espreitando qualquer existência de carne e osso supostamente comestível. Viviam aqui, eu conhecia essas pessoas, mas agora não são mais os mesmos. Em tais circunstâncias, os seres-vivos dividem-se em apenas dois grupos: nós e eles. É a mais pura questão de sobrevivência...

Chamei por Rufus, mas ninguém respondeu. Ouço apenas os ruídos dos miseráveis à procura de comida. Comecei a pensar num modo de sair dali, e então a caminhonete a álcool de meu vizinho me veio à memória. O pobre Seu Gustavo está morto, e é um caso de vida ou morte, Deus vai me perdoar. Agarro tudo o que possa ser usado como arma, uma lanterna e alguns mantimentos; analiso qualquer detalhe mal calculado e sigo minha trilha pela noite à dentro. A densidade da névoa aumentou drasticamente nos últimos minutos, mas depositei toda minha fé e esperança nas noções de orientação que aprendi com a vida.

Ando uns 10 metros e me deparo com o que restou do caseiro, e outros 2 malditos alimentado-se das suas tripas. Executei o par com uma única saraivada de balas e rumei adiante. A mordida no braço, decorrente de uma meia-hora antes, começou a retalhar-me com uma dor incisiva e agonizante, beirando o insuportável. Tentei focar-me em lembranças agradáveis, para desviar a atenção da lamuria, mas não funcionou muito bem.

Pulei a cerca e avistei a bendita caminhonete; só faltava atravessar a plantação.

Um ronco agudo transgrediu meus tímpanos; estava a alguns metros a minha direita. Não era nada que tivesse visto antes, disso eu tinha certeza; tratava-se de algo diferente, inédito, uma nova atração no circo de aberrações. Todos os meus sentidos ficaram inquietos, e a proximidade que se encontrava fresou até minha última célula. Virei-me e, digo de passagem, o que vi quase surtou minha sanidade. Um grande animal quadrúpede de pelagem acinzentada, aparentemente um canídeo, banqueteava-se vorazmente da carcaça de uma vaca. A mandíbula, equipada com dentes cirurgicamente posicionados, arrancava volumosos pedaços de carne da presa abatida. Ao me farejar, ergueu a cabeça vagarosamente - pequenos fragmentos do bovino escorreram pela boca - e enquadrou seus globos oculares bioluminescentes em mim. Não sei descrever em palavras mortais o tormento que senti. Segurei firme o gatilho, mas logo o cachorro perdeu o interesse e voltou para a carcaça; ela devia ter mais proteínas. Segui em frente a passos sorrateiros.

11 mordedores sedentos por sangue emergiram entre mim e a caminhonete. Saquei o coquetel molotov – fabricado rapidamente na cozinha - acendi com o isqueiro e lancei bem no meio dos desgraçados. Uma esfera incandescente engoliu a maioria deles; usando seus corpos como combustível, as chamas se propagaram. Encerrei a balada com a 47 e mais dois cartuchos de munição. Consegui chegar na caminhonete e, antes de cantar vitória, ninguém menos que meu companheiro Rufus surgiu de trás do veículo.

- Rufus! Graças a Deus, estava procurando você – falei com entusiasmo.

Mas ele não respondeu. Cambaleou até mim, mostrando uma certa dificuldade em ajustar a coordenação motora. O rapaz estava bem diferente do que eu lembrava. Não quis acreditar, me iludi e fiquei lá olhando pra ele, esperando algum sinal de humanidade. Logo, lembrei da senha, para caso um de nós dois virasse a casaca. Se Rufus realmente se transformou em um inimigo, não conseguiria lembrar da resposta secreta.

- Hey Rufus! Responda agora: “Gato Preto ou Mula Sem-Cabeça?”

Mais uma vez, o idiota não respondeu. O correto seria dizer “Lobisomem”; foi isso que combinamos, mas já tinha certeza que o cara não era Rufus. Não tive outra opção...

- Sinto muito companheiro, foi bom enquanto durou...

Aquele disparo foi o mais difícil de toda à noite. Entrei no carro e usei ligação direta para fazer aquela carroça ressurgir do ferro-velho. Estourei o portão e acelerei pela estrada de terra, sem olhar para trás.



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Crédito imagens: Pyro † ĐarkŊicto 火

12 comentários:

Wendely Leal disse...

Gostei, cara.

Vou assinar o feed pra ler os próximos... Só acho que dá pra caprichar um pouco mais nas imagens ;)

Abraço

♏Gabriel Desaix♌ disse...

Caio, eu gostei da dinâmica da narrativa e da linguagem também. Rápida como toda cena de ação necessita e bem elaborada. Como esse é um capitulo teste não sei se esse primeiro parte é a de abertura e você vai começar a história a mil, como está começando e vai esplicar o porque de tudo mais tarde. Mas acho que talvez você poderia criar um clima de suspense e trabalhar a psicologia dos personagens antes para depos começar a fazê-los, correr, principalmente o narrador personagem. Mas do que li, gostei, prende a atenção e a narração é está ótima.
abraço.

Ana Kaya disse...

Caio menino, que maravilha de texto de enredo.
Fiquei com a boca aberta até ler o final. Que espero não tenha acabado e que vc continue a fazer mais capítulos.
Nossa que maravilha, que sutileza, que coisa lindaaaaaaaaaaaaaaaaa.
Isso é horror de primeira qualidade.
Sinceramente, me ajoelho a teus pés ehehehhehe.
As pessoas falam mas não é fácil arrumar imagens que combinem 100% como que estamos falando. Achei tudo muito bom para o teste.
Aprovadíssimo, aguardo o resto.
Não ligue pra tantas opiniões, senti que fez com o coração e é isso que dá vida ao texto. Adorei.
Beijos e me chame pra ver o resto.

Thiers Rimbaud disse...

Amigo, lembrei de um filme que assisti; por algum motivo os seres se transmutaram. Tornaram-se monstros e se desumanizaram. Isto tudo me lembra própria humanidade, atualmente tão desumana. Precisamos nos defender daqueles que por algum motivo passaram a inexistir. Não sei se poderia chamar de febre do capitalismo. Afinal deixei de me preocupar com a política pq esta me enoja.
Vamos então a ‘seu filme’...
A narrativa é bela, com um português correto, é possível sentir toda a trama você propõe.
Não sei se haverá capítulos, mas quero te parabenizar pelo enredo... olha que não é minha temática. Quem te fala é alguém que conhece literatura. Você está no caminho certo.
Parabéns

Thiers R>

Caio Tadeu de Moraes disse...

Seguindo as críticas, imagens atualizadas!!

Créditos ao incandecente companheiro Pyro :D

Unknown disse...

muuuito bom!!! continnua a história...
já adicionei como favoritos no meu blog!! :]

Giovani Iemini disse...

http://www.bardoescritor.net/ebooks/estradaparaoinfinitodemaobranca.pdf

acho que vc vai gostar deste ebook.
[]s

Morgana torta disse...

legal pra caralho

Fillipe Ramos disse...

Caio meu irmão paulista mais novo.. não tenho q diser nada sobre o texto.. pois vc sab o quanto gosto d sua escrita.. vc está mto melhor q no ano passado por exemplo..
Entre no msn, temos q falar sobre um conto semanal(seu) que quero encomendar.. Estou mudando o
ideiaoverground.blogspot.com
e quero sua ajuda.
abraço irmão..

Fillipe Ramos disse...

Volte.. temos q acertar os pontos de partida..

quero um piloto.. ainda para essa semana.. mande para newtraceur@gmail.. força na semelhança com anime..

abraço..

Anônimo disse...

Muito bem escrito. Material de qualidade.
Ass.: DeLuca
Minha Comunidade: http://www.orkut.com.br/Main#Community.aspx?cmm=201148

Heitor disse...

ei caio quer fazer uma parceria ttbm escrevo um livro sobre zumbis
sou o único que resta
conta muita coisa sobre eles,a quisa sore cura e lgo ele irá virar livro cara
ta ai o link
http://sou-o-unico-que-resta.blogspot.com